Um dos impactos mais indiscutíveis da nossa espécie sobre a biodiversidade é a destruição de gigantes por onde quer que a humanidade passe. Que o digam os mamutes da Eurásia e das Américas ou os lêmures do tamanho de gorilas que um dia viveram em Madagascar: espécies grandalhonas são as primeiras que ceifamos. Mas, mesmo no caso das que ainda existem, os indivíduos de grande porte invariavelmente são os mais cobiçados e devorados pelo Homo sapiens. Os que sobram acabam parecendo nanicos perto dos que existiam outrora.
Em muitos casos, porém, isso está se revelando uma péssima ideia. De acordo com um novo e revelador estudo, há indícios crescentes de que os indivíduos grandalhões –que também tendem a ser os mais velhos e experientes– fazem muita falta para seus companheiros de espécie.
O trabalho, coordenado pelo ecólogo Keller Kopf, da Universidade Charles Darwin, na Austrália, acaba de sair na revista Science, e é um daqueles raros exemplos de pesquisa capazes de fazer a gente enxergar o quebra-cabeças da biodiversidade de uma maneira muito diferente da usual. (E confesso que fiquei feliz em saber que existe uma universidade batizada em honra ao velho Darwin.)
Kopf e seus colegas reuniram uma grande massa de dados, sobre os mais diferentes tipos de animais, para argumentar que existem dois grandes jeitos de transformar os indivíduos de grande porte e integrantes da “melhor idade” em peças-chave de suas espécies.
O primeiro é mais comum em certos grupos de invertebrados (grandes crustáceos, digamos), peixes e répteis, como as tartarugas marinhas. Nesse caso, estamos falando de bichos que não têm propriamente um limite intrínseco para seu crescimento, podendo aumentar de tamanho ao longo da vida.
Também são animais que conseguem se reproduzir sem problemas independentemente da idade –aliás, podem até gerar mais filhotes quando já têm muitas décadas de vida (uma das descobertas mais impressionantes das últimas décadas, por exemplo, é a de que existem indivíduos centenários, ou até multicentenários, entre peixes de grande porte). E eles tendem a apostar na geração de um grande número de bebês por vez (a grande maioria dos quais não vai chegar à fase reprodutiva).
Os grandalhões desses grupos, portanto, são verdadeiras “poupanças reprodutivas” de suas espécies. Mas há outro caminho para a velhice respeitável.
E é basicamente o adotado por nós e por outros primatas de grande porte, mas também por baleias ou elefantes, por exemplo. Nesses casos, a geração média de filhotes por indivíduo é baixa. E a vida reprodutiva das fêmeas pode terminar bem antes da expectativa de vida total delas –o que chamamos de menopausa, basicamente.
Mas os indivíduos já “aposentados” da reprodução são cruciais para a transmissão de conhecimento, cuidando de filhotes (seus netos ou outros), conduzindo o grupo com sua experiência e mesmo repassando elementos culturais (que existem nessas espécies). Em outras palavras, são idosos e sábios. O que, aliás, talvez valha também até para alguns tipos de peixes.
É claro que continua fazendo sentido proteger mães e filhotes. Mas é bem possível que as prioridades de conservação mereçam ser repensadas para levar em conta os vovôs de cada espécie. Respeitar anciões, afinal, nunca fez mal a ninguém.
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