O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) criticou o pedido de indiciamento feito pela Polícia Federal contra ele outras 36 pessoas no inquérito que apura uma suposta tentativa de golpe de Estado no país. O relatório, que está sob sigilo, foi enviado nesta quinta-feira (21) ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Bolsonaro também desaprovou a condução do ministro Alexandre de Moraes nas investigações sobre o caso. As declarações do ex-presidente foram dadas ao portal Metrópoles e publicadas posteriormente na rede social X.
“O ministro Alexandre de Moraes conduz todo o inquérito, ajusta depoimentos, prende sem denúncia, faz pesca probatória e tem uma assessoria bastante criativa. Faz tudo o que não diz a lei”, disse Bolsonaro.
Ainda sobre as investigações, o ex-presidente afirmou que é preciso aguardar o posicionamento da Procuradoria-Geral da República (PGR). Se o órgão entender que há elementos suficientes que demonstram a participação nos atos, vai oferecer à Justiça a denúncia contra os envolvidos. Se a denúncia for acolhida pelo ST, Bolsonaro e seus auxiliares irão se tornar réus no processo.
“Tem que ver o que tem nesse indiciamento da PF. Vou esperar o advogado. Isso, obviamente, vai para a Procuradoria-Geral da República. É na PGR que começa a luta. Não posso esperar nada de uma equipe que usa a criatividade para me denunciar”, completou o ex-presidente.
Bolsonaro fez uma referência ao juiz instrutor do gabinete de Moraes, Airton Vieira, que teria pedido para o perito Eduardo Tagliaferro usar a “criatividade” contra a Revista Oeste durante troca de mensagens obtidas e divulgadas pela Folha de S. Paulo em agosto deste ano.
Já a defesa do general Walter Braga Netto repudiou “veementemente” o vazamento de informações de inquéritos à imprensa “em detrimento do devido acesso às partes diretamente envolvidas e interessadas”. Ex-ministro da Defesa, Braga Netto também foi indiciado pela Polícia Federal nesta quinta-feira (19) por suposta tentativa de golpe de Estado.
“A defesa técnica do General Walter Souza Braga Netto destaca e repudia veementemente, e desde logo, a indevida difusão de informações relativas a inquéritos, concedidas ‘em primeira mão’ a determinados veículos de imprensa em detrimento do
devido acesso às partes diretamente envolvidas e interessadas”, diz a nota assinada pelos advogados Luís Henrique Prata, Gabriella Venâncio e Francisco de Lima.
Também indiciado pela PF, o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), que foi diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo Bolsonaro, foi mais um dos membros da direita que criticou o STF e afirmou que o “ordenamento no Brasil passou a ser a criatividade”. “Não importa construção da segurança jurídica. Fundamentos do iter criminis [caminho do ato criminoso], fases para um crime, da ideação à consumação, com conceitos modificados. Sistema acusatório, divisão entre investigação, acusação, julgamento e a própria vítima completamente desrespeitado e descaracterizado”, disse Ramagem.
“A lógica investigativa foi alterada de materialidade à autoria, para um início a partir da escolha de alvos, necessidade de imputar e posterior ‘produção’ de provas. Juiz natural, competência, legalidade e devido processo relativizados. É a praxe processual no Brasil atual. Aqui, sim, não há eventos isolados. Narrativas se tornam fatos. Estúpidos absurdos como essa descabida prisão do Filipe Martins, com vergonhosa conclusão de relatório, é um dos diversos e graves atropelos à ordem e legalidade. Onde isso irá parar? Excessos e perseguições estão mais que evidentes. Não está mais apenas para a história julgar”, completou o deputado.
Indiciamento era esperado pelos aliados de Bolsonaro
Para o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RJ), o indiciamento já era esperado e “representa sequência ao processo de incessante perseguição política ao espectro político” da direita. O parlamentar cobrou que a PGR possa “cumprir com serenidade, independência e imparcialidade sua missão institucional, debruçando-se efetivamente sobre provas concretas e afastando-se definitivamente de meras ilações”.
“Ainda, ao reafirmar o compromisso com a manutenção do Estado de Direito, confiamos que o restabelecimento da verdade encerrará longa sequência de narrativas políticas desprovidas de suporte fático, com o restabelecimento da normalidade institucional e o fortalecimento de nossa Democracia”, comentou o líder da oposição.
Aliado do ex-presidente Bolsonaro, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) afirmou que o pedido de indiciamento pela PF teria relação com a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos e seria um “desespero”. “É reação à eleição de Donald Trump, despero e perseguição aos conservadores e a direita no Brasil. Força e ânimo ao [ex-]presidente Jair Bolsonaro e a todos indiciados”, disse o parlamentar.
Ainda na avaliação de Cavalcante, o caso “fortalece” o ex-presidente. “É o que a imprensa já havia anunciado que deveria acontecer. A perseguição só fortalece o Bolsonaro”, opinou.
Reportagem da Gazeta do Povo mostrou que, logo após a vitória de Trump nos Estados Unidos, a direita brasileira também passou a projetar a volta de Bolsonaro em 2026. O ex-presidente brasileiro foi declarado inelegível pela Justiça Eleitoral até 2030, mas existe a expectativa por parte da direita que a situação seja revista ou alterada por meio do Legislativo.
Após a divulgação do pedido de indiciamento de Bolsonaro e demais integrantes do antigo governo, o deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS) afirmou que vai aguardar a publicação na íntegra do relatório para se manifestar. “Peço por gentileza o envio do relatório (mais um) vazado à imprensa para que eu possa me manifestar. Mas tem de ser na íntegra, não a conta-gotas. Sem ler, fica difícil. Obrigado”, escreveu o deputado no X.
Aliados de Lula cobram punição por suposto plano de golpe
Na contramão da direita, os aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) comemoraram o pedido de indiciamento de Bolsonaro e dos demais suspeitos e cobraram punição aos que foram apontados pela PF como participantes do suposto plano de golpe.
A presidente nacional do partido, deputada Gleisi Hoffmann (PR), disse que indiciamento “abre o caminho para que todos venham a pagar na Justiça pelos crimes que cometeram contra o Brasil e a democracia”.
Já o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), defendeu que não haja anistia para os envolvidos no suposto plano de golpe de Estado. “O Brasil demonstra ao mundo que possui instituições republicanas consolidadas, prontas para defender o Estado democrático de direito. Ditadura, nunca mais”, disse o petista.
Na mesma linha, o senador Fabiano Contarato (PT-ES) aproveitou para criticar a discussão sobre a anistia. “O inquérito da Polícia Federal aponta que Bolsonaro sabia de todo o plano golpista para matar Lula, Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes. Que a força da justiça seja implacável e exemplar. Ninguém deve sair impune! Sem anistia para quem ousa atacar a nossa democracia”, defendeu.
Já o ministro Jorge Messias, da Advocacia-Geral da União (AGU), afirmou que o pedido de indiciamento é uma “resposta contra os ataques à democracia”. “A notícia de indiciamentos pela PF do ex-mandatário e de integrantes do núcleo de seu governo pela prática dos crimes de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa, oferece ao país a possibilidade de concretizar uma reação eficaz aos ataques à nossa Democracia, conquista valiosa e indelével do povo brasileiro”, disse.
O ministro Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação, subiu o tom e pediu “Bolsonaro na cadeia”. “Bolsonaro é indiciado por integrar organização criminosa que tentou dar um golpe de Estado assassinando o presidente Lula, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes. Bolsonaro na cadeia”, afirmou.
Além deles, a ministra Anielle Franco, da Igualdade Racial, citou suposto plano de golpe e afirmou, sem citar nomes, que “confirmamos que veio de cima o projeto de extermínio e ódio ao Brasil”.
“A cada novo detalhe dos gravíssimos planos de golpe de Estado e de execução contra nossas lideranças políticas, confirmamos que veio de cima o projeto de extermínio e ódio ao Brasil, pondo vidas, direitos e instituições no mais alto risco. Nós resgatamos a democracia, e com ela o diálogo, o respeito e a civilidade. Não aceitaremos retrocesso algum. Seguimos vigilantes e como disse hoje o nosso presidente Lula, é um Brasil da união que precisamos construir, onde o mais importante é fazer mais escolas, cuidar dos mais pobres, pagar salários dignos”, disse a ministra.