O foguete Starship, da SpaceX, excede em muito os níveis máximos de ruído, gerando um estrondo sônico tão poderoso que pode causar danos materiais na comunidade residencial densamente povoada perto de seu local de lançamento no sul do Texas, sugerem novos dados.
As medições —do som e da pressão do ar gerados durante o quinto lançamento de teste, no mês passado— são as mais abrangentes divulgadas até o momento para o Starship, o maior e mais poderoso foguete já construído.
Tão alto quanto um prédio de 30 andares, o veículo é tão grande que gera dez vezes mais ruído do que o Falcon 9, foguete que a SpaceX usa atualmente para levar carga e astronautas à órbita, de acordo com os novos dados.
Para os moradores de South Padre Island e Port Isabel, cidades que estão a cerca de dez quilômetros da base de lançamento da SpaceX no sul do Texas, o ruído durante o voo de teste de outubro foi equivalente a estar a 60 metros de distância de um avião Boeing 747 durante a decolagem, segundo Kent L. Gee, engenheiro acústico que conduziu o monitoramento.
Gee preside o departamento de física e astronomia da Universidade Brigham Young em Provo, Utah, e ajuda a Nasa a estudar maneiras de reduzir os impactos sonoros gerados por aviões supersônicos. Os resultados do teste foram publicados na última sexta-feira (15) no Journal of the Acoustical Society of America.
Procuradas, a FAA (administração federal que regula lançamentos comerciais nos EUA) e a SpaceX não se manifestaram.
Quando o jato supersônico Concorde ainda estava em serviço, os Estados Unidos os proibiram de voar sobre terras domésticas para que os estrondos sônicos não assustassem o público abaixo ou os preocupassem com possíveis danos materiais, de acordo com a Nasa.
O voo do Starship em outubro foi cerca de 1,5 vez mais alto no solo do que o estrondo sônico do Concorde, mostraram os resultados do teste.
O ruído mais alto não ocorreu durante a decolagem do Starship, quando o foguete impulsionado por 33 motores subiu ao céu. Pelo contrário, os dados do teste indicaram que o pico de ruído foi gerado pelo estrondo sônico cerca de 6,5 minutos após a decolagem, quando o propulsor Super Heavy retornou ao local para seu pouso autônomo no lançador.
Durante a decolagem, o impacto sonoro na cidade de Port Isabel atingiu um máximo de 105 decibéis, conforme os dados. Isso é aproximadamente igual ao nível de ruído emitido durante um show de rock médio ou durante o uso de uma motosserra. Conforme o propulsor Super Heavy voltava, o nível máximo de ruído percebido em Port Isabel e South Padre Island foi de cerca de 125 decibéis, equivalente ao som de um tiro à queima-roupa.
Conforme esse som atingiu a comunidade, ele criou brevemente um evento de sobrepressão que excedeu o nível em South Padre Island que a FAA havia projetado em outubro.
Testes separados foram realizados no mês passado por um consultor de som, Terracon de Houston, contratado por autoridades de Port Isabel. As autoridades locais têm ficado cada vez mais preocupadas com a possibilidade de que os lançamentos da SpaceX possam danificar casas na cidade de aproximadamente 5.000 habitantes.
A Terracon identificou um nível de pressão sonora de pico de 144,6 decibéis conforme o foguete descia, o que também é mais alto do que Port Isabel esperava, segundo o administrador da cidade, Jared Hockema.
“Estamos todos a favor do desenvolvimento econômico e do trabalho que a SpaceX está fazendo”, disse Hockema. “Só queremos um desenvolvimento econômico que ocorra de maneira que siga a lei e não prejudique os moradores ou o meio ambiente.”
No teste de outubro, alarmes de carro dispararam nas ruas onde os técnicos estavam fazendo o monitoramento de som. E, segundo Hockema, a cidade recebeu uma série de relatos de moradores sobre danos menores durante os lançamentos da SpaceX, embora não tenham sido coletados dados sobre o total.
Gee e sua equipe instalaram dispositivos de teste em oito locais a partir de dez quilômetros —no telhado do Hotel Margaritaville em South Padre Island, uma comunidade turística— até 35 quilômetros de distância, em uma casa particular em Brownsville, a cidade grande mais próxima.
Não foram realizados testes mais próximos ao local de lançamento, embora haja dezenas de casas na vila de Boca Chica, a menos de três quilômetros da plataforma de lançamento, e em áreas rurais próximas. A área também é cercada por uma reserva nacional de vida selvagem e um parque estadual que abrigam várias aves e tartarugas ameaçadas ou em perigo, que também podem ser prejudicadas pelo ruído.
Tem havido dados extremamente limitados ao público sobre o impacto real do ruído dos cinco testes de lançamento em escala total do Starship até outubro.
O jornal The New York Times noticiou neste ano que a SpaceX prejudicou o meio ambiente nas proximidades do local de lançamento. Às vezes, a empresa ignorou promessas que havia feito quando propôs pela primeira vez a construção de uma plataforma de lançamento no sul do Texas em 2012, prometendo ter uma “pequena pegada ecológica”.
Os dados coletados por Gee no mês passado apresentaram algumas inconsistências. Considerando medições em frequências que os humanos normalmente ouvem —ignorando certas frequências baixas e altas—, o lançamento de teste do Starship em outubro teve níveis mais baixos em todos os locais de teste do que a FAA havia projetado.
As perguntas sobre o impacto sonoro do Starship são importantes, já que a SpaceX planeja, uma vez que os testes estejam completos, lançar o foguete de dois locais próximos ao Centro Espacial Kennedy, na Flórida, bem como do sul do Texas.
“Não ficaria surpreso se realizássemos 400 lançamentos do Starship nos próximos quatro anos”, afirmou Gwynne Shotwell, diretora de operações da SpaceX, em uma conferência na semana passada em Nova York.
Gee e sua equipe pretendiam medir o ruído novamente durante o teste desta terça-feira (19). Condições climáticas e de vento podem afetar como o ruído se propaga, então os resultados podem ser diferentes.