Ao longo de mais de um ano após a data inicial de interdição parcial de hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico determinada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), São Paulo internou 746 pacientes em seus quatro estabelecimentos.
Os dados são da Secretaria da Administração Penitenciária do governo estadual e foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. Segundo a resolução 487 do CNJ, de 2023, esses locais, conhecidos como manicômios judiciários, deveriam iniciar a interdição parcial —fechar a porta de entrada— a partir de 15 de agosto do ano passado.Em meio a manifestações de resistência e dificuldades para conduzir um trabalho individualizado para cada paciente, os prazos da determinação têm passado por diferentes prorrogações. Segundo o CNJ, o plano de São Paulo, encaminhado pelo Tribunal de Justiça do estado, tem previsão de conclusão até o segundo trimestre de 2026.
Mas esse planejamento pode mudar devido à continuidade de internações. Somente em 2023, de 15 de agosto em diante, foram 224 internados. Já nos primeiros dez meses deste ano, foram 522 —uma média de 52 por mês.
A determinação do CNJ institui a política antimanicomial no Judiciário e determina o atendimento de inimputáveis —que não compreendem seus atos— na rede geral de saúde, com os CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) como principal equipamento e internações por períodos curtos, com foco na estabilização.
O CNJ disse ter recebido o plano do TJSP para a execução da política antimanicomial no estado, que envolve nove ações, 56 tarefas e 31 produtos. O trabalho é monitorado por grupos no estado como o Comitê Estadual Interinstitucional de Monitoramento da Política Antimanicomial (Ceimpa), que reúne desembargadores do tribunal e representantes de Ministério Público, Defensoria Pública e gestores e conselheiros de saúde e assistência social.
Em nota, o tribunal elencou desafios como desigualdades territoriais em relação à assistência em saúde, especialmente em municípios menores, sem CAPS ou residências terapêuticas, e a necessidade de articulação com o Sistema Único de Assistência Social, o SUAS, para viabilizar os benefícios. Também citou a existência das unidades de residência terapêutica que têm custeio feito apenas pelo município, por ainda não terem habilitação no Ministério da Saúde.
Já o planejamento tem tarefas como a organização das equipes conectoras, que juntam profissionais de saúde e assistência social, entre outros, responsáveis por acompanharem o processo de desinternação de cada paciente, a revisão de casos e a montagem de um fluxo de trabalho para o fechamento gradual dos manicômios judiciários.
O pedido de prorrogação do prazo até a metade de 2026 foi autorizado pelo conselheiro José Rotondano, supervisor do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) do CNJ. Ele determinou que o estado informe o andamento do trabalho até a metade de 2025, disse, em nota o Conselho.
“Destaca-se que as Resoluções do CNJ possuem força vinculante, o que significa dizer que seu cumprimento é obrigatório.” O órgão não disse se existem sanções para o caso de descumprimento.
No fim do primeiro semestre deste ano, São Paulo abrigava 898 das 1.750 pessoas em medida de segurança de internação no Brasil, segundo relatório da Senappen (Secretaria Nacional de Políticas Penais).
A unidade que recebeu mais pacientes de 15 de agosto do ano passado ao fim de 31 outubro foi a de Taubaté, com 279 internados. Em seguida estão o hospital de custódia de Franco da Rocha I, no setor masculino (230), o Franco da Rocha II (197) e o Franco da Rocha I, setor feminino (40).
Em agosto, o CNJ prorrogou o fechamento total, previsto para o dia 28 daquele mês. Agora, os estados têm até 29 de novembro deste ano para apresentar um plano para a interdição parcial e a completa, com previsão de data para a conclusão do trabalho e as justificativas.
São Paulo tem um programa estadual de apoio à desinstitucionalização dos pacientes, publicado pela pasta da Saúde do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) em agosto. O texto prevê, por exemplo, o apoio financeiro para a instalação e a manutenção por um ano de serviços residenciais terapêuticos destinados a receberem quem está internado há dois anos ou mais ininterruptamente nos manicômios judiciários.
Procurada, a secretaria da Saúde não disse quantas equipes conectoras estão atuando no estado.
Esses grupos, formados por médicos, psicólogos e assistentes sociais, entre outros, fazem avaliações e acompanham os casos de desinternação. “Os internos aptos à ressocialização serão recebidos pela Rede de Atenção Psicossocial (Raps) nos diversos municípios paulistas, respeitando os vínculos sociofamiliares de cada indivíduo”, disse a pasta.
Também mencionou a necessidade de apoio financeiro para a implantação das residências terapêuticas.