A Rússia fez um apelo ao presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, para manter seu país no Acordo de Paris. A Arábia Saudita, por sua vez, informou na COP29, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática em curso em Baku (Azerbaijão), que estava comprometida com a transição para o sistema de energia verde.
As declarações dos dois países produtores de petróleo e gás reflete os altos e baixos geopolíticos da conferência, na qual prevalece a incerteza em torno da ameaça de retirada dos EUA do pacto.
Esse componente cresceu com a retirada dos negociadores da Argentina do evento por decisão de seu presidente, Javier Milei, o que levantou temores da renúncia desse país do acordo.
Em Baku, países historicamente vistos como bloqueadores do progresso nas discussões globais defenderam o Acordo de Paris, o pacto assinado por quase 200 países em 2015 em torno dos esforços necessários para evitar o aquecimento global.
Boris Titov, representante especial para cooperação internacional sobre sustentabilidade do presidente russo, Vladimir Putin, afirmou ao Financial Times nesta sexta-feira (15) “ter certeza” que sair do Acordo de Paris não seria a decisão correta de países como a Argentina e os EUA.
“Temos de trabalhar com o Acordo de Paris. Não podemos sair, mas podemos torná-lo mais eficiente”, afirmou.
Em Bruxelas, autoridades da União Europeia mencionaram seus temores de um efeito dominó em caso de Trump remover os EUA do Acordo de Paris, assim como da mais perigosa possibilidade de Trump retirar seu país da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática, assinada em 1992 no Rio de Janeiro.
Tais temores levaram a União Europeia e o governo de Joe Biden, cujo mandato termina em janeiro, a flertar com o setor privado e com a China, em um esforço de fortalecer as ações climáticas.
Embora a Arábia Saudita traga à memória, nas negociações da COP29, sua longa performance como bloqueadora, o enviado de seu governo a Baku, Khalid Almehaid, vice-minitro de sustentabilidade e mudança climática e principal negociador, afirmou que o Acordo de Paris trouxe “um enorme desafio”. Mas seu país decidiu que queria “embarcar nesse trem”.
“Ficou muito claro que, naquela época [do Acordo de Paris], os países mais impactados seriam os produtores de petróleo, especialmente os em desenvolvimento”, afirmou. “Nós embarcamos no trem. Nós temos certeza de que vamos ser um líder”, completou, para sublinhar que a Arábia Saudita tem se concentrado em energia renovável, eficiência energética e captura de gases-estufa emitidos pelo uso de combustíveis fósseis.
Almehaid afirmou que, até o fim deste ano, o país terá acesso a 44 gigawatts de energia renovável. Em 2022, gerava menos de 1 gigawatt. “Se a Arábia Saudita pode fazer a transição, creio que qualquer um no mundo pode também”, disse. “Gostaríamos de ver todos os produtores de petróleo fazerem o mesmo para garantir que eles estão totalmente engajados com a mudança climática e a futura transição.”
No início da semana, a China fez um chamado ao futuro governo de Trump para continuar os trabalhos ligados à mudança climática com os países da Ásia. EUA e China são os dois maiores emissores de gases-estufa do mundo.
Sombras do petróleo
O ex-vice-presidente americano Al Gore descreveu a COP29 como “desafiadora” e que suas discussões estão sob as “sombras do petróleo e da geopolítica”, durante evento da organização Climate Reality Project em Baku.
Gore também alertou que os países ocidentais estão perdendo terreno para mercados emergentes, como a China, quando se trata de mudança climática e transição energética. Em especial, para a acelerada adoção de fontes renováveis.
“Nos próximos anos, espere a China reivindicar a liderança global da aceleração dessa mudança e, de repente, o Oeste estará vulnerável a ser caracterizado como o vilão”, declarou.
Países vulneráveis à mudança climática também sublinharam a importância do Acordo de Paris nesta sexta-feira. Cedric Schuster, ministro de recursos naturais e meio ambiente de Samoa e presidente da Aliança dos Estados Pequenas Ilhas (Aosis, na sigla em inglês) disse: “A Aosis está aqui para defender o Acordo de Paris”.
Gideon Behar, enviado especial de Israel para mudança climática e sustentabilidade, também deu seu apoio ao pacto. “Para nós, o Acordo de Paris é importante, e vemos a Convenção-Quadro como a maior autoridade para a tomada de decisões e o consenso sobre questões climáticas”, disse.
Ele acrescentou que a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática continua essencial, por trazer juntos ministros e negociadores de toda parte do mundo a construir posições de consenso.
“Sem o mecanismo que temos hoje, estaríamos em uma situação totalmente diferente. Então, as COPs são importantes, e o processo também o é. O diálogo internacional-nacional que acontece nelas é importante”, afirmou.
Apesar de os EUA terem sido o único país a abandonar o Acordo de Paris, durante o primeiro mandato de Trump (retornaram sob Joe Biden), os temores de contágio emergiram. O ministro de Meio Ambiente do Suriname, Marciano Dasai, afirmou: “Se a Argentina e os EUA saírem, o Acordo de Paris estará sobre risco de fracasso completo. Não há plano B.”
Dasai queixou-se de que, como a Argentina, o Suriname está “cansado de ser deixado de lado” e ressentido com a falta de financiamento para a proteção de sua floresta. “A comunidade internacional demonstrou total falta de respeito com a América do Sul e com o papel crucial de nossos países na mitigação da mudança climática.”