A aviação brasileira tem uma série de protocolos de segurança que definem como se dá a reação das autoridades diante de violência em setores restritos de aeroportos ou que afetem diretamente as operações aéreas. Entretanto, não há um plano de reação para casos em áreas externas ou abertas, como ocorreu na sexta-feira passada (8), quando duas pessoas foram mortas no desembarque do terminal 2 em Guarulhos, na Grande São Paulo.
Por volta das 16h, dois homens armados saíram de um carro em frente ao ponto de táxi do aeroporto internacional e dispararam contra o empresário Antonio Vinicius Lopes Gritzbach, 38, que foi morto na hora.
Um motorista de aplicativo que estava no local morreu posteriormente, e outras duas pessoas acabaram baleadas, mas tiveram alta.
O local do crime foi cercado, assim como acessos a ele, por pouco mais de cinco horas. O maior aeroporto do país, entretanto, não parou.
Segundo a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), o “grave evento” em Guarulhos não tem conexão com as operações aéreas, e está relacionado com segurança pública.
A agência afirma que o aeroporto dispõe de um plano de contingência como parte integrante do Programa de Segurança Aeroportuária, que contempla a participação das forças policiais “dependendo do caso concreto”.
A Anac não deu detalhes de como é esse plano.
O aeroporto, além de segurança própria, conta com agentes da Polícia Federal e na sexta, próximo ao ataque a tiros, havia um ônibus da Guarda Civil Municipal de Guarulhos.
Para especialistas ouvidos pela reportagem, o assassinato que ocorreu na sexta-feira pode ser tipificado como ato de interferência ilícita de AVSEC (do inglês “aviation security”, que significa segurança da aviação).
“Hoje, pela legislação federal, não existe um plano de contingência para áreas externas, mas para as controladas e restritas”, diz Icaro Gattolini Martho, chefe do Centro de Operações Aeroportuárias da Rede Voa, concessionária que administra 16 aeroportos no interior paulista.
Segundo ele, as leis vigentes foram montadas após o ataque às torres gêmeas em Nova York, em 11 de setembro de 2001 e visam a operação aérea.
Martho diz que foi correta a manutenção da operação do aeroporto, por todo problema que seu fechamento poderia provocar à malha aérea brasileira.
O RBAC (Regulamento Brasileiro de Aviação Civil) 107, que estrutura e padroniza o Plano de Segurança Aeroportuária, diz que “o operador de aeródromo deve estabelecer e implantar o zoneamento de segurança do terminal de passageiros, demarcando-o em plantas da edificação do terminal, de forma que permita a interpretação clara das áreas”.
Esse zoneamento de segurança no terminal de passageiros é obrigatório quando se atende voos com aeronaves com capacidade superior a 30 assentos. Não informa, entretanto, se o aeroporto deve bloquear saídas em caso de ato de violência ou de terrorismo em um terminal de desembarque.
Marcos Almeida, consultor de gestão de crises e continuidade de negócios, que, entre outros trabalhou como gerente de segurança no Galeão (Rio de Janeiro), afirma que há protocolos de reação para o casos de um atirador que dispara a esmo, por exemplo, a partir de treinamentos com funcionários e polícia sobre como se abrigar e socorro.
Mas os aeroportos, diz, não estão preparados para um crime como o de sexta-feira, em que os assassinos fugiram 13 segundos depois.
“O problema do que aconteceu em Guarulhos é que houve um assassinato. Foram ali com o objetivo específico de eliminar [Griztbach]. Então, um plano de contingência para esse tipo de ação é extremamente difícil e realmente não se tem isso”, afirma Almeida.
No fim de semana, a Polícia Federal instaurou um inquérito para investigar o crime, mas sem federalizar o caso. Procurada para falar sobre protocolos em aeroportos, a PF não respondeu à reportagem.
Em nota, a Polícia Militar afirma que o batalhão de área mantém planejamento técnico no entorno do aeroporto de Guarulhos e que realizou simulados nos últimos dois anos com foco em intervenções armadas e atendimento tático.
“Esses treinamentos visam aprimorar a resposta em cenários críticos, buscando rápida assistência às vítimas e a manutenção da segurança no local, preservando a rotina do aeroporto sempre que possível.”
A gestão do aeroporto tem 30 dias para enviar enviar à Anac informações sobre como tratou a violência da semana passada. A agência diz que, após avaliar os procedimentos adotados, se preciso, serão implantadas medidas de correção.
O especialista em segurança Marcus Almeida acredita que o caso vai servir de estudo para definição de ações contra a violência em áreas comuns. Cita ainda tecnologias que podem ser empregadas, como câmeras termais para identificar armas sob a roupa escondida sob a roupa.
Em nota, a GRU Airport, concessionária que administra o aeroporto, afirma ter prestado socorro imediato aos feridos. Reforça que segurança pública é competência de Estado e que vem colaborando com as autoridades policiais, inclusive com o fornecimento das imagens captadas por suas câmeras.
Lançado no ano passado pelo governo federal, o programa Aeroportos+Seguros prevê, entre outras medidas, a instalação de mais câmeras e mais iluminação no check-in e nas áreas de bagagens; biometria para identificação de passageiros e funcionários, além de monitoramento e inspeção de bagagens nas esteiras, novos equipamentos de raio-X, scanners corporais e detectores de líquidos e explosivos. Não fala em áreas externas.
A primeira fase do programa apontou a implantação de medidas que envolvem o incremento da segurança nas áreas de circulação de passageiros e bagagens em Guarulhos, com modernização dos equipamentos de inspeção.