Lideranças indígenas do Brasil, da Austrália e das ilhas do Pacífico anunciaram uma aliança inédita por meio de suas organizações, nesta quarta-feira (13), na conferência do clima da ONU (Organização das Nações Unidas), a COP 29, em Baku, Azerbaijão.
Inspirada na estrutura da troica das presidências das COPs, a aliança tem como missão assegurar que as pautas e os interesses das populações originárias sejam priorizados nas negociações climáticas, além de manter uma coordenação contínua para as edições seguintes da conferência.
O novo grupo de articulação internacional é formado pela Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), a Organização dos Povos Indígenas da Austrália e a Rede de Ação Climática das Ilhas do Pacífico.
Em nota divulgada à imprensa, a troica indígena manifestou preocupação com os recentes acordos firmados entre os anfitriões da conferência —os Emirados Árabes Unidos, em 2023, o Azerbaijão neste ano, e o Brasil, em 2025. Para o grupo, esses países não estão comprometidos com o fim do uso dos combustíveis fósseis.
“Isso vai na contramão do objetivo global de limitar o aquecimento a 1,5°C e contradiz diretamente a liderança climática que essas nações deveriam exercer”, diz trecho do comunicado.
O Brasil realizará no ano que vem a COP30 no Pará, um dos nove estados da Amazônia Legal, com a expectativa de reunir a maior participação de indígenas de todas as edições. Para 2026, o país cotado a sediar o evento é a Austrália, que deve contar com amplo apoio das ilhas do Pacífico.
Pela defesa da floresta amazônica e do oceano, considerados os maiores sumidores de gás carbônico do mundo, a troica indígena ressalta a importância dos povos originários na mitigação das mudanças climáticas.
Segundo a Coiab, os indígenas da amazônia brasileira são as pessoas que mais sofrem os efeitos da devastação do bioma provocados pelo garimpo, grilagem de terras, tráfico de drogas e de animais, desmatamento ilegal e queimadas.
Alana Manchineri, porta-voz da Coiab, afirma que a entidade representativa dos povos da amazônia tem uma atuação efetiva nos debates internacionais desde a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92 ou Eco-92), realizada no Rio de Janeiro em 1992.
A Coiab integra também o G9, grupo de coalizão dos nove países da Bacia da Amazônia criado durante a COP16 da Biodiversidade, promovida entre outubro e novembro em Cali, na Colômbia. Entre os pedidos iniciais do G9 estão a co-presidência indígena da COP30, em Belém (PA), e a demarcação de terras como medida de proteção dos biomas brasileiros.
“Sempre precisamos fazer incidência política na agenda internacional porque nossos direitos não estão garantidos e entendemos que os presidentes e chefes de Estado não têm apresentado, de fato, a solução que nós entendemos ser necessária para barrar as mudanças climáticas”, disse Manchineri à Folha.
No passado, 60% dos australianos negaram em referendo o reconhecimento dos aborígenes como primeiros habitantes do território, o que impediu a reformulação da Constituição para a criação de um órgão consultivo para lidar com temas relacionados aos indígenas do país e aos povos do Estreito de Torres no Parlamento.
Ao contrário de outras nações com histórias semelhantes, como o Canadá e a Nova Zelândia, a Austrália não reconheceu formalmente nem chegou a um tratado com os seus povos originários. Eles representam 3,8% da população total de 26 milhões do país, mas não são mencionados na Constituição, de 1901.
Também formam o grupo mais desfavorecido do país, segundo indicadores socioeconômicos, registrando altas e desproporcionais taxas de suicídio, violência doméstica e encarceramento, além da expectativa de vida cerca de oito anos menor do que a dos australianos não aborígenes.
Tuvalu, por sua vez, é um dos países mais afetados pelas mudanças climáticas e lidera o grupo formado pelas ilhas do Pacífico. Especialistas temem que o arquipélago possa ficar completamente submerso em 100 anos por causa do aumento do nível do mar.
Acordo bilateral de novembro de 2023 permitirá aos cidadãos de Tuvalu direito de residência permanente na Austrália, com acesso à educação, à saúde e ao trabalho. Esta foi a primeira vez que um país assumiu compromisso legal de ajuda à população de Tuvalu, em consideração à crise climática que o atinge.
Objetivos da troica indígena:
-
Estabelecer uma aliança global que represente povos indígenas e seus aliados
-
Ampliar a incidência indígena nos níveis internacional, nacional e local, unindo lutas
-
Pressionar as nações ricas para cumprirem suas responsabilidades no financiamento climático e aumentar o financiamento direto para iniciativas lideradas por povos indígenas
-
Encerrar a era dos combustíveis fósseis com uma transição energética justa
-
Atuar para que as metas climáticas dos países estejam alinhadas com o desafio de redução das emissões de gases de efeito estufa e de proteção da vida no planeta