A Defensoria Pública estadual enviou ofício ao secretário de Segurança Púbica de São Paulo, Guilherme Derrite, em que recomenda o uso de câmeras corporais por policiais militares durante as operações em Santos, no litoral paulista. A recomendação ocorre após a morte de uma criança de 4 anos e um adolescente de 17, e por causa da notícia de aumento do efetivo policial na Baixada Santista com homens de batalhões especializados.
Durante uma entrevista coletiva na última quarta-feira (6) sobre o caso, o coronel Emerson Massera afirmou que os policiais envolvidos não usavam câmeras corporais. Ele disse que os batalhões que eles integram não possuem o equipamento.
O pedido tem como base as regras da própria PM. As defensoras que assinam o ofício, integrantes dos núcleos de Cidadania e Direitos Humanos e de Infância e Juventude do órgão, citam a portaria nº PM1-04/02/2024 como argumento para a recomendação.
“Nas operações de grande envergadura realizadas pela Polícia Militar para a restauração da ordem pública, será priorizada a utilização de tropa que esteja portando a COP [Câmera Operacional Portátil”, diz um trecho da portaria citado pelas defensoras. O documento faz a ressalva de que, em casos em que não houver estrutura para utilizar os equipamentos, os homens podem ser dispensados de usá-lo.
O coronel Massera afirmou na quarta que a corporação iniciaria uma operação na região, com reforço de policiamento, incluindo o Batalhão do Choque. No dia seguinte, já era possível notar o aumento da presença de viaturas do batalhão nas ruas de Santos.
O ofício enviado a Derrite também relata que viaturas do Batalhão de Choque rondaram o velório de Ryan da Silva Andrade Santos, 4, e que uma equipe da Força Tática da PM fazia abordagens em frente ao cemitério, o que provocou um bate-boca entre policiais e o ouvidor das polícias, Cláudio Aparecido da Silva. A presença de policiais no trajeto entre o velório e o enterro foi considerada uma intimidação por familiares, moradores e representantes de entidades de proteção aos direitos humanos.
“Os fatos narrados se inserem em um contexto de aumento da letalidade policial no Estado de São Paulo, particularmente na cidade de Santos”, lembram as defensoras no documento. O número de pessoas mortas por PMs em serviço no estado cresceu 82% na comparação dos primeiros nove meses de 2024 com o mesmo período de 2023, como mostrou a Folha.
As defensoras pedem ao secretário informações como o envio dos boletins de ocorrência da morte do adolescente e da criança, a identificação de todos os policiais envolvidos, a motivação para a incursão no Morro São Bento na noite de terça, e o motivo para a presença ostensiva de policiais durante a carreata em homenagem a Ryan.
Minoria de mortes na Escudo teve filmagem
A falta de câmeras corporais nas fardas de PM foi uma crítica frequente durante a Operação Escudo, deflagrada no fim de julho do ano passado após a morte de um soldado da Rota (rondas Ostensivas Tobias de Aguiar). Das 27 ocorrências em que pessoas foram mortas pela PM na operação (houve um caso com duas mortes), apenas 7 tiveram imagens das câmeras corporais recebidas. Em dois casos, houve dados recebidos parcialmente.
Os policiais não portavam câmeras em 14 ocorrências. Há casos em que os policiais, mobilizados em todo o estado para a operação, afirmam que viajaram para o litoral sem os equipamentos que recarregam as baterias das câmeras. Essa foi a justificativa, por exemplo, para a falta de gravações no caso que resultou na morte de Cristian Rebelo dos Santos, morto, aos 38 anos, em 15 de agosto em Guarujá.
“Os policiais militares relacionados na ocorrência foram para a operação em 14 de agosto de 2023, às 6h, devendo permanecer até o dia 18 de agosto às 22h, estando os mesmos munidos de suas câmeras corporais, porém com autonomia média de 12h devido a carga da bateria”, diz um e-mail enviado pelo 1º Baep, de Campinas, após questionamentos em um inquérito sobre o caso.
“Devido a não terem a disponibilidade de carregamento através de docas específicas, não utilizavam as câmeras corporais no momento da ocorrência.” O problema foi solucionado no dia seguinte à morte do suspeito. A investigação sobre a morte foi arquivada.
Em dezembro do ano passado, após um pedido do mesmo núcleo de Direitos Humanos da Defensoria, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que o uso de câmeras corporais não é obrigatório em operações que tenham como finalidade responder a ataques contra policias militares. As defensoras entraram com um recurso no STF (Supremo Tribunal Federal) e, desde então, a Corte monitora o uso das câmeras corporais pela PM paulista.