Com uma campanha que é apenas um tutorial de 13h para o grind do design serviço, Suicide Squad não tem nada de particularmente interessante, mesmo que o gameplay consiga esporádicos momentos divertidos.
Suicide Squad: Kill the Justice League da Rocksteady Studios até pode ser resumido como um The Division com super-heróis, uma ideia com o seu interesse (mesmo que se torne automaticamente num produto com um público específico), mas vindo da produtora da trilogia Batman: Arkham não é ousado escrever que está longe de ser o que os fãs esperavam. Ainda assim, todos os criativos merecem expandir a sua arte e tentar ideias diferentes, algo que até poderá resultar em experiências com apelo.
No caso deste esforço da Rocksteady, não tens nada de particularmente mau ou mal feito, é uma tentativa de criar um jogo de ação cooperativa com design serviço com super-heróis, em escala AAA. Isto significa um mundo aberto de escala média, gráficos de grande qualidade e cenas dignas de um filme de super-heróis. Fica a ideia que o objetivo é uma evolução do design da trilogia Arkham, expandido para cooperativo sem prescindir do foco na campanha cinematográfica, e nas primeiras horas até consegue esse efeito.
As primeiras horas de Suicide Squad: Kill the Justice League conseguem um equilíbrio encorajador, com um forte foco na campanha e narrativa, possível de jogar a solo (com três bots a acompanhar). Amanda Waller recruta Harley Quinn, Killer Shark, Boomerang e Deadshot para uma missão impossível, descobrir como libertar Lanterna Verde, Flash, Superman e Batman do controlo de Brainiac e impedir a iminente destruição da Terra, a começar com Metropolis. É uma ideia rebuscada e louca, mas quem lê mensalmente as BDs da DC Comics sabe que tudo é possível nestes universos de fantasia.
Como o título sugere, não existe forma de salvar os membros da Liga da Justiça e matá-los é a única forma de sonhar com uma hipótese de travar Brainiac. Isso confirma automaticamente que este quarteto de degenerados terá de enfrentar os quatro membros da Liga da Justiça em boss fights e tudo soa empolgante, no entanto não o é. Para chegar às boss fights e ver as cutscenes de história (os melhores momentos do jogo), terás de participar em sucessivas atividades banais e repetitivas, que estragam o ritmo de jogo.
Design suicida
A Rocksteady tenta apresentar-te algo similar a Batman: Arkham, mas com a possibilidade do cooperativo juntamente com os típicos elementos serviço como XP, habilidades desbloqueáveis para formar builds personalizadas com cada um dos 4 personagens, e claro, armas de diversas categorias. Não teria qualquer problema com isto, até o encarei como algo curioso e empolgante, mas a execução não é a melhor e mostra que aquilo que escreveram no papel não foi traduzido da melhor forma no gameplay. Especialmente problemático é ver que cometem praticamente todos os erros associados a jogos serviço já existentes há vários anos no mercado.
Para chegar às boss fights, assistir às cutscenes e avançar na história, terás de cumprir diversas missões banais, num jogo desenhado para fazer da campanha um tutorial glorificado com o desejo de conseguir aquele efeito “o endgame é quando começa”. Suicide Squad: Kill the Justice League está longe do desastre que muitos apregoavam, mas não cumpre com o potencial pois existe uma notória falta de engenho para criar um ciclo gameplay divertido, o que denota falta de experiência no género.
Como referi, para avançar na história tens de cumprir missões banais que serão repetidas ao longo das horas seguintes, para te ensinar o conteúdo endgame que terás de realizar para obter as melhores recompensas e enfrentar mais bosses. Os melhores momentos de Suicide Squad: Kill the Justice League não compensam a sua banalidade e até resultam numa experiência frustrante. As missões incluem uma pequena diversidade e todas elas basicamente se focam em eliminar inimigos, mas o tom aproxima-se do frustrante com a introdução de modificadores como o real desafio que as diferencia.
Habilidades, gunplay e modificadores
Os diversos tipos de missão em Suicide Squad: Kill the Justice League focam-se praticamente todos no mesmo, eliminar inimigos numa zona para libertar/destruir o objetivo ou proteger um veículo. Cumprir as missões recompensa-te com novas armas, equipamento como chips com buffs, XP para subir de nível, o que permite desbloquear mais habilidades, e itens relacionados com a economia criada para melhorar/modificar armas. É o ciclo habitual num jogo serviço: repetir missões muito similares, obter recompensas e esperar que a sorte te favoreça com armamento mais poderoso.
A possibilidade de escolher entre várias habilidades em cada patamar de 3 árvores de habilidade é um aspecto positivo, deixa-te criar uma versão da personagem adequada à tua interpretação do gameplay. Por exemplo, eu gostei dos ataques físicos que permitem aplicar estados aos inimigos (como os congelar) e gostei da mecânica do ataque físico mandar os adversários pelo ar para seguir com um disparo certeiro. Foquei a minha build em tirar o melhor proveito desses ataques físicos para aumentar rapidamente o multiplicador do combo e ativar buffs, como proteção de escudo extra. Conciliar o gameplay com a minha diversão personalizada e tirar proveito disso através da build é um ponto muito positivo.
A Rocksteady conseguiu um gunplay e gameplay divertido, e se me imagino a eventualmente voltar a Suicide Squad: Kill the Justice League para desfrutar do endgame será por isso mesmo, mas parece que por cada ponto positivo, existe um negativo a contrariar. Se o gunplay e mecânicas de combate são divertidas, as mecânicas para percorrer Metropolis geram alguma fricção e requerem alguma habituação, poderá ser uma literal dor de cabeça tentar combater e usar essas mecânicas de movimentação quando o jogo mostra dificuldades em mostrar a ação. No entanto, o pior é mesmo o uso de modificadores como tentativa de introduzir diversidade no ciclo gameplay.
Terás missões de diversas personagens para cumprir o obter recompensas, mas todas as elas caem nos parâmetros já referidos, eliminar inimigos. A Rocksteady decidiu tentar contrariar a sensação que estás sempre a fazer o mesmo ao introduzir modificadores nos inimigos e isso força-te a executar ações específicas para os vencer, o que tem o efeito de colocar restrições nada divertidas. No jogo, as personagens estão protegidas por um escudo e para recuperar escudo tens de ativar esse estado num inimigo para depois o atacar com um ataque físico. Isso pode ser feito ao disparar para ele (acertar nas pernas aumenta a probabilidade de o colocar nesse estado) e certos inimigos entram num estado que te permite disparar um contra-ataque e só assim causas dano.
A Rocksteady decidiu criar modificadores para as missões e ramificar as interpretações do mesmo gameplay repetido ao longo de todas elas. Os exemplos são missões modificadas para apenas causar dano de uma certa forma, seja com granadas, quebrar de escudo ou com inimigos afligidos por uma qualquer aflição, como gelo ou fogo. Isto força-te a jogar de forma específica e por vezes apenas reforça a frustração. Na prática é uma boa ideia, mas em conjunto com problemas de performance, HUD demasiado preenchido, problemas de câmara e Bots que nem sempre te ajudam (nas boss fights nem sequer fazem nada) torna-se numa experiência muito menos divertida do que seria de desejar.
Endgame
Não há como enganar, Suicide Squad: Kill the Justice League é um daqueles jogos no qual os créditos são apenas o início, no qual a Rocksteady te quer convencer a permanecer após a campanha para repetir as mesmas atividades e desbloquear mais armas. Ao progredir na campanha, és preparado para esta fase, na qual terás de percorrer dimensões alternativas para obter melhor equipamento, realizar missões mais difíceis, com os modificadores a permanecerem uma das principais características, e na qual se torna essencial jogar acompanhado por outros humanos.
Tendo em conta que Suicide Squad: Kill the Justice League é um jogo bonito, mas ainda assim uma experiência visualmente cansativa, na qual (e isto é-me difícil de explicar) sentes que existe demasiado ruído visual, especialmente com o HUD, o endgame apresenta-te mais um elemento da economia e um ciclo que poderá afastar muitos jogadores. Isto porque participar nas missões mais importantes exige jogar missões específicas para obter um novo recurso endgame, que terás de usar como moeda para pagar as tuas incursões pelos Elseworlds (outras dimensões da Terra).
A ideia é criar uma simbiose entre todas as atividades, transmitir a sensação que estás sempre a jogar em prol do progresso universal. Seja para obter armas, desbloquear novos patamares de vendedores de armas ou criadores de buffs, e claro para ganhar XP e obter mais habilidades. No entanto, as tarefas são sempre as mesmas, as missões são pequenas variações da mesma atividade, e o gunplay divertido é desafiado pela insistência em modificadores que te forçam a jogar de determinada maneira, mesmo que isso aumente a tua frustração.
Suicide Squad: Kill the Justice League chega com a Season Zero, focada em Bane, como uma amostra do tratamento pós-lançamento. Isto permite-te descortinar a abordagem da Rocksteady, com novo gear e equipamento extra que podes obter ao completar missões específicas e Incursões. O jogo atira-te imenso conteúdo e desafios, seja cumprir missões ou eliminar adversários de forma específica. É aqui que se sente inequivocamente que a campanha é apenas um tutorial glorificado para o endgame.
A indiferença de um desserviço
Com uma tentativa de fazer humor com o design serviço e informar que o final não é o final, apenas o início do grind em Suicide Squad: Kill the Justice League, os créditos encerram a narrativa e dão início à experiência como serviço com a sua verdadeira força. A Rocksteady Studio introduz-te ao seu ciclo gameplay, novas economias e recompensas, mas de forma resumida isto apenas significa repetir durante dezenas de horas o que já fizeste até aqui.
Apesar de raros momentos graciosos e divertidos, Suicide Squad: Kill the Justice League é o pior tipo de experiência com as quais podes interagir: não te vais sentir particularmente revoltado por lhe dedicar o teu tempo, mas também sentirás que não perdes nada se não a jogares. É um jogo que suscita indiferença e isso é o pior que se pode dizer de uma experiência interativa, a incapacidade para empolgar e deixar memórias.
Prós: | Contras: |
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