Um pedido de vista do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin suspendeu, nesta quarta-feira (6), o julgamento de uma ação que questiona a proibição de laqueadura e vasectomia a menores de 21 anos ou a pessoas que não tenham até dois filhos. O pedido de vista interrompe o julgamento por até 90 dias.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5911 foi ajuizada pelo PSB, em 2018. Para o partido, essas regras para esterilização voluntária “afrontam direitos fundamentais, contrariam tratados internacionais firmados pelo Brasil, além de divergir dos principais ordenamentos jurídicos estrangeiros”. Além disso, os trechos da lei apontados seriam uma ingerência do Estado sobre o planejamento familiar.
O relator da ação, o ministro Nunes Marques, negou os argumentos do PSB e votou pela constitucionalidade do trecho que restringe a esterilização a homens e mulheres com capacidade civil plena, maiores de 21 anos, ou com pelo menos dois filhos. Além de mencionar a legitimidade do Poder Legislativo para esta determinação (seria ativismo judicial mudar a interpretação no Judiciário), citou a necessidade da proteção de menores em momentos de vulnerabilidade.
“É perverso apresentar a uma jovem que sequer atingiu a maioridade civil e, possivelmente, em situação de vulnerabilidade, a opção de tornar-se definitivamente estéril, como resposta para um problema social grave, que é a gravidez na adolescência”, disse Nunes Marques.
O ministro Flavio Dino acompanhou o relator.
Relembre o caso: AGU e Congresso defenderam restrições à esterilização precoce
Na época que o PSB apresentou a ADI 5911, em 2018, a regra impugnada determinava a necessidade de autorização expressa do cônjuge e a idade mínima de 25 anos ou dois filhos vivos para realizar os procedimentos.
Em 2022, a Lei 14.443 promoveu alterações na norma original sobre o tema. A autorização do cônjuge para realização da laqueadura foi retirada, e a idade mínima passou para 21 anos. Contudo, a restrição do método continuou condicionada ao número mínimo de dois filhos.
Em 2021, nos autos da ADI 5911, a Advocacia-Geral da União (AGU) se posicionou pela improcedência do pedido do PSB. De acordo com o órgão, mesmo que o Código Civil estabeleça que a maioridade começa aos 18 anos, não há impedimento para que se fixem idades superiores a essa para o exercido de determinados direitos, como ocorre em diversos casos, desde que haja justificativa.
A AGU destacou que a própria Constituição estipula idade superior a de 18 anos para o desempenho de certos cargos públicos eletivos. Também há determinação de idade mínima para aquisição e posse de armas (25 anos) e exercício de funções como a de conselheiro tutelar (21 anos).
“De modo semelhante, a permissão para a esterilização voluntária merece tratamento jurídico diferenciado. A submissão a tal procedimento constitui escolha irreversível e de grande relevância para a vida particular e social de cada pessoa, de modo que se revela adequado exigir certo grau de maturidade para seu exercício válido”, argumenta a AGU.
De acordo com a AGU, ao contrário do que argumenta o PSB, a redação da Lei 9.263, ao invés de estabelecer uma restrição indevida à liberdade e à autonomia privada, possibilita que as pessoas desenvolvam seu planejamento familiar de maneira informada, livre e amadurecida, com o apoio do Estado e com as cautelas que a decisão sobre ter filhos ou não demanda.
Em 2021, o Congresso também se manifestou sobre a ADI 5.911, atendendo à solicitação feita pelo STF. A Câmara dos Deputados informou que a Lei 9.263/96 “foi processada nesta Casa dentro dos estritos trâmites constitucionais e regimentais inerentes à espécie”. Já o Senado defendeu a constitucionalidade das normas questionadas pelo PSB. Para o Senado, o tema foi alvo de amplo debate parlamentar que contou com a participação ampla e irrestrita da sociedade.
O órgão ainda ressaltou que o Poder Legislativo é o ambiente propício e constitucionalmente adequado para deliberar sobre a matéria, de modo que a pretensão do requerente consistiria em “alterar a decisão prevalecente no Congresso Nacional, transformando o Supremo Tribunal Federal em instância revisora do político, no caso, das regras para a esterilização voluntária”.