Cientistas treinaram roedores gigantes para farejar o comércio ilegal envolvendo animais selvagens, desde chifres de rinoceronte até escamas de pangolim, impulsionando a crescente luta contra o lucrativo contrabando da vida selvagem.
Os ratos se saíram bem em dois testes em um porto em Dar es Salaam, a maior cidade da Tanzânia, e agora estão sendo preparados para um papel mais amplo na inspeção de armazéns e contêineres de transporte. A implantação expande o uso dos roedores em várias funções, que já incluem a descoberta de patógenos da tuberculose até minas terrestres.
O tráfico de produtos ilegais da vida selvagem é avaliado em até US$ 20 bilhões por ano, de acordo com a Interpol, tornando-o um dos maiores e mais lucrativos mercados ilícitos do mundo.
“Nosso estudo mostra que podemos treinar ratos-gigantes-africanos para detectar vida selvagem traficada ilegalmente, mesmo quando ela foi ocultada entre outras substâncias”, disse Isabelle Szott, pesquisadora da Fundação Okeanos e coautora de um artigo publicado na semana passada na revista científica Frontiers in Conservation Science.
“As maiores vantagens dos ratos são seu tempo de treinamento relativamente curto, flexibilidade para trabalhar com diferentes treinadores e custo-efetividade.”
Os ratos-gigantes-africanos —que podem crescer até quase 1 metro de comprimento, do nariz à cauda— foram treinados em várias fases usando recompensas como objetos aromatizados.
Eles começaram aprendendo a “cutucar o nariz” em um buraco contendo um cheiro alvo, como presa de elefante. Em seguida, foram ensinados a ignorar outros odores comumente usados para esconder remessas de contrabando, incluindo cabos elétricos e grãos de café.
Os ratos, que foram treinados na organização sem fins lucrativos de treinamento de animais Apopo, se mostraram tão bons quanto os cães em lembrar cheiros meses após sua última exposição, disseram os pesquisadores.
Alguns dos investigadores peludos —Kirsty, Marty, Attenborough, Irwin, Betty, Teddy, Ivory, Ebony, Desmond, Thoreau e Fossey— foram nomeados em homenagem a conservacionistas e ativistas contra o tráfico de animais.
Seu próximo teste será trabalhar no porto usando usando coletes feitos sob medida. Quando identificarem mercadorias contrabandeadas, devem puxar uma bola presa à roupa com as patas dianteiras para acionar um alerta sonoro para seus manipuladores.
O treinamento de cada rato custa de US$ 7.000 a US$ 8.000 (de R$ 40,5 mil a R$ 43,6 mil) para estar habilitado para operações existentes, como detecção de minas terrestres e de tuberculose. Isso representa uma fração do preço de tecnologias de inspeção eletrônica, como raios-X e scanners, disseram os pesquisadores.
“A imagem negativa dos ratos como animais sujos esconde o fato de que são disciplinados e muito limpos, inteligentes e simpáticos”, disse Kate Webb, outra coautora do estudo e professora assistente da Universidade Duke. “Quando nossos ratos estão trabalhando, eles estão focados no trabalho”, disse Webb.
O tráfico de vida selvagem aumentou com a demanda de compradores por espécies raras como animais de estimação, bem como o uso de partes do corpo em medicamentos tradicionais e itens de luxo.
O comércio envolve cada vez mais grupos de crime organizado e apresenta riscos para a saúde humana, pois pode espalhar doenças infecciosas e desencadear pandemias. Brigadas de roedores parecem ser uma “ótima ideia”, disse Tim Redford, coordenador de treinamento da Fundação Freeland, grupo não governamental de combate ao tráfico de vida selvagem.
“Combater o crime contra a vida selvagem é caro e os orçamentos estão sempre apertados, então ratos de busca provavelmente serão uma solução prática para as agências de aplicação da lei”, disse ele, acrescentando que as criaturas devem ser “cuidadas de forma ética e recompensadas por seu trabalho”.
Defensores do uso de roedores dizem que seu tamanho e suas incríveis habilidades olfativas devem permitir que alcancem cantos de contêineres de carga e aberturas de ventilação até mesmo onde cães podem ter dificuldade em chegar.
“As gangues criminosas por trás desse comércio destrutivo e ilegal se adaptam constantemente ao seu modus operandi”, disse Richard Scobey, diretor executivo do grupo sem fins lucrativos Traffic, que monitora os fluxos globais de vida selvagem. “Para superá-los, as equipes de aplicação da lei precisam de uma ampla gama de ferramentas.”