Prestes a ser confirmado como o ano mais quente da história da humanidade, 2024 atingiu “novos patamares perigosos” para o clima. Por conta das mudanças climáticas, os cidadãos do planeta enfrentaram, em média, 41 dias adicionais de calor perigoso à saúde.
A análise é de um novo relatório da World Weather Attribution e da Climate Central, que destrinchou dados e estudos sobre um ano marcado por eventos climáticos extremos intensificados pela ação humana
“Os impactos do aquecimento por combustíveis fósseis [origem da maior parte dos gases de efeito estufa na atmosfera] nunca foram tão claros ou devastadores quanto em 2024. Estamos vivendo em uma nova era perigosa”, disse. Friederike Otto, líder da WWA e professora de ciência climática no Imperial College de Londres.
“O clima extremo matou milhares de pessoas, forçou milhões a deixarem suas casas este ano e causou sofrimento implacável. As inundações na Espanha, furacões nos EUA, seca na Amazônia e inundações em toda a África são apenas alguns exemplos”, completou a pesquisadora.
Ao longo do ano, a World Weather Attribution produz trabalhos científicos analisando os principais eventos climáticos extremos que acontecem no planeta. De acordo com o relatório, as mudanças climáticas intensificaram 26 dos 29 eventos climáticos estudados pela instituição.
Oficialmente, essas catástrofes mataram pelo menos 3.700 pessoas, mas as cifras reais dos desastres ambientais são estimadas como sendo muito maiores.
“Esses foram apenas uma pequena fração dos 219 eventos que atenderam aos nossos critérios de ativação, usados para identificar os eventos climáticos mais impactantes. É provável que o número total de pessoas mortas em eventos climáticos extremos intensificados pelas mudanças climáticas neste ano esteja na casa das dezenas ou centenas de milhares”, detalhou o documento.
Ainda em novembro, diversas instituições de pesquisa, como o Observatório Copernicus, da União Europeia, já indicavam que 2024 substituiria 2023 como o mais quente da história.
O primeiro semestre do ano foi de recordes de temperatura para os respectivos meses.
Depois, o planeta registrou os dois dias mais quentes da série histórica, 21 e 22 de julho.
Embora o fenômeno climático El Niño —que contribui para secas e temperaturas mais altas em várias regionais— tenha influenciado muitas das catástrofes naturais, os pesquisadores concluíram que o aquecimento global teve um impacto muito maior nesses eventos.
Foi o caso, inclusive, da grande seca que atingiu a amazônia.
“Secas severas na bacia amazônica estão se tornando mais frequentes e graves devido às mudanças climáticas”, disse Regina Rodrigues, professora da Universidade Federal de Santa Catarina. “Tememos que elas possam empurrar a floresta irreversivelmente para um estado mais seco, levando a uma redução do fluxo de umidade e do sumidouro de carbono, bem como à perda de biodiversidade.”
Alimentados pelo clima seco e mais quente?
Os incêndios florestais também proliferaram em várias áreas do planeta.
“Embora incêndios individuais possam ser causados por fenômenos naturais, como raios, ou por atividades humanas, condições de calor e seca significam que, se houver um ponto de ignição, as chances de o fogo se espalhar e se intensificar são muito maiores, e qualquer incêndio será muito mais difícil de controlar. Esse risco crescente de incêndios decorrente das mudanças nos padrões climáticos é frequentemente agravado por outras atividades humanas, como o desmatamento”, pontuou o relatório.
O continente americano foi particularmente atingido pelos fogos, e o Brasil foi um dos destaques.
De acordo com o levantamento, o pantanal brasileiro enfrentou a segunda pior temporada de incêndio em duas décadas, com mais de 3,5 milhões de hectares queimados.
“A região está em uma seca que já dura anos, com níveis de rios em mínimas históricas e precipitação abaixo da média climatológica. Isso permitiu que os incêndios começassem em junho, muito antes do início usual da temporada de fogo.”
Segundo os cientistas da WWA, as mudanças climáticas tornaram as condições severas de clima de fogo no início da temporada no pantanal de 4 a 5 vezes mais prováveis.
Os pesquisadores reforçaram a necessidade de reduzir drasticamente as emissões de gases de efeito estufa para frear as mudanças climáticas e suas consequências mais graves.
“Em 2025, todos os países precisam intensificar os esforços para substituir os combustíveis fósseis por energia renovável e se preparar para o clima extremo”, disse Friederike Otto, líder da WWA.